segunda-feira, 15 de abril de 2019

Tive o privilégio de entrevistar Paulo Freire, patrono da Educação, que está sob ataque injusto


Folhetim (Folha de S. Paulo)
1º de julho de 1979, p3
Lídia Maria de Melo                
Cresci ouvindo falar de Paulo Freire com muito respeito, devido a seu método de alfabetização, que se popularizou pelo nome de Método Paulo Freire.
O mundo reverenciou suas ideias. Atualmente, é o terceiro pensador mais citado em universidades internacionais e brasileiras da área de humanas.
O Brasil também reverenciou suas ideias, embora as escolas públicas nunca tenham implantado seus métodos de modo sistemático.
Depois de ter conseguido ensinar 300 adultos a ler e a escrever em 45 dias, foi convidado pelo presidente João Goulart a desenvolver o Plano Nacional  de Alfabetização, que previa cursos de formação de professores por todo o  País.
Após o golpe militar de 1964, o pernambucano Paulo Reglus Neves Freire, nascido em 19 de setembro de 1921, passou 70 dias preso.
Quando saiu da prisão, deixou o Brasil, para somente retornar em 1979, com a assinatura da Lei de Anistia.
Em 2012, quinze anos após sua morte, ocorrida em 2 de maio de 1997, foi declarado Patrono da Educação  Brasileira.
Quando me tornei jornalista, tive a honra de entrevistar Paulo Freire em 22 de setembro de 1988, na Redação do jornal A Tribuna, em Santos, e ele me contou que, enquanto vivia no exílio, participou de um congresso na Grécia e, na saída do teatro onde o encontro ocorreu, um vendedor ambulante cumprimentou-o por sua obra. Aquela manifestação deixou-o muito feliz. 
Folhetim (Folha de S. Paulo)
1º de julho de 1979, p.4
Ele também me disse que não criou um método. O que colocou em prática foi uma filosofia educacional que contextualizava o ensino, empregando na alfabetização palavras que faziam sentido aos alunos, como, por exemplo, "tijolo", "casa", "saúde", e despertavam o pensamento crítico.
Conversamos ainda sobre uma pitangueira, da qual ele sentia saudades enquanto vivia longe do Brasil. O assunto veio à baila, porque comentei sobre a entrevista à jornalista Ione Cirilo, publicada em 26 de agosto de 1979,  no Folhetim, suplemento dominical do jornal Folha de S. Paulo.  Essa entrevista ao Folhetim tinha como título uma frase do próprio Paulo Freire sobre a pitangueira: "Se você tiver uma pitangueira em casa, cuide das pitangas... Pode ser que um dia você se exile também".
Em meu início de carreira no Magistério, lecionei em uma escola particular, de 1978 a 1982, e era chamada de "tia". Isso me incomodava. Não pelas crianças, mas pelo fato de pressentir uma falta de respeito à minha profissão. Quando comentava sobre esse incômodo, ninguém me compreendia. Anos depois, soube que "professora" passou a ser tratamento obrigatório nessa escola.

Entrevista de Paulo Freire
Folhetim em 26/8/1979, p. 8
Entrevista de Paulo Freire
Folhetim em 26/8/1979, p.9

Em 1993, Paulo Freire lançou o livro "Professora, sim; tia, não". Lavou minha alma quando escreveu: "A tentativa de reduzir a professora à condição de tia é uma "inocente" armadilha ideológica em que, tentando-se dar a ilusão de adocicar  a vida da professora, se tenta amaciar a sua capacidade de luta ou entretê-la no exercício de tarefas fundamentais. Entre elas, por exemplo, a de desafiar seus alunos, desde a mais tenra e adequada idade, através de jogos, de estórias, de leituras para compreender a necessidade de coerência entre discurso e prática; um discurso sobre a defesa dos fracos, dos pobres, dos descamisados; um discurso que nega a existência das classes sociais, seus conflitos, e a prática política em favor exatamente dos poderosos".
De uns tempos para cá, com espanto, vejo brasileiros atacarem as ideias do educador Paulo Freire. Diversos países, no entanto, reverenciam-no e adotam suas ideias em seus planos educacionais. Por que o Brasil quer destruir seu patrimônio cultural e intelectual? Não seria um suicídio? Pense nisso. 
Para saber mais sobre a obra de Paulo Freire, clique aqui e aqui também. 
Um de seus livros mais conhecidos é Pedagogia do Oprimido, de 1968. 
Para ler as reportagens, faça download das imagens dos jornais acima. 


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