A pessoa preside um país de dimensões continentais, o maior
da América Latina, a nona economia do mundo, mas comparece ao Fórum Econômico
Mundial, em Davos, na Suíça, e fala por apenas 7 dos 30 minutos a que tinha
direito. Seu discurso é marcado por mensagens implícitas e lugares-comuns
empregados na campanha eleitoral, como por exemplo: "... uma política na
qual o viés ideológico deixará de existir"; "Vamos resgatar nossos
valores..."; "Vamos defender a família e os verdadeiros direitos
humanos"; “Deus acima de tudo”.
Esse senhor, escolhido por 1/3 da população eleitora,
desconhece o conceito de "ideologia". Ele e seus asseclas não sabem que tudo o que pensam,
propagam e executam é ideológico. Ou seja, não é a ideologia dos opositores,
mas é a sua ideologia.
Antes de seu (des)governo, o Brasil não travava relações
econômicas com países por "viés ideológico" especificamente de
esquerda, como ele deixa subentendido. Tanto que, ao mesmo tempo, se
relacionava economicamente, e se relaciona, com Estados Unidos, China,
Venezuela, Cuba, Guiné Equatorial, Austrália, França, Reino Unido, Alemanha,
entre tantos outros de todos os continentes.
O discurso do sr. Bolsonaro é marcadamente ideológico, mas
vazio de projetos. Peca pela falta de objetividade, porque não explica o que
vai fazer, quando afirma que irá "resgatar nossos valores",
"vamos defender a família e defender os verdadeiros direitos
humanos". Quais são os valores que ele classifica por "nossos"?
O que ele entende por "verdadeiros" direitos humanos? Será que ele
sabe que as definições de direitos humanos são universais?
Não tenho nada contra Deus. Ao contrário, acredito em uma
força maior que rege o universo e nossas vidas. Rezo todos os dias e peço
proteção a Nossa Senhora Aparecida. Tenho uma imagem de São Longuinho, comprada
na Catedral de Pedra, em Canela, na Serra Gaúcha, porque desde criança aprendi
a recorrer a esse santo, quando perdia algum objeto, e ele sempre me atendeu.
Procuro seguir os preceitos cristãos, mas isto é questão de fé e de foro
íntimo. Fé não se discute. O Estado Brasileiro é laico. E dessa
forma deve continuar sendo, porque é o que estabelece nossa Constituição em seu
artigo 5.º, inciso VI.
Os implícitos presentes no curto discurso do presidente do
Brasil causam-me também preocupação no que se referem ao meio ambiente. Ele
alfinetou os países que se manifestaram em defesa das florestas brasileiras,
como a Noruega. "Somos o país que mais preserva o meio ambiente. Nenhum
outro país do mundo tem tantas florestas como nós", expressou. Sua intenção, de fato,
não foi defender as florestas, nem a população indígena, que respeita o meio
ambiente e ajuda a preservar, ao manter suas reservas.
O que o sr. Bolsonaro afirmou, de modo indireto, para
sossegar seus apoiadores ruralistas, é que pretende ampliar a área ocupada pelo
agronegócio, nem que para isso precise derrubar mais árvores. Eis o que ele
disse: "A agricultura se faz presente em apenas 9% do nosso território e
cresce graças a sua tecnologia e à competência do produtor rural. Menos de 20%
do nosso solo é dedicado à pecuária. Essas commodities, em grande parte,
garantem superávit em nossa balança comercial e alimentam boa parte do
mundo."
Ou seja, para o atual chefe de Estado brasileiro,
preservação florestal é bobagem. O que importa é ampliar o pasto do gado e as
plantações de soja, porque isso é que dá dinheiro. Se o Planeta Terra está sob
ameaça, problema das próximas gerações. O que ele precisa é cumprir compromisso
de campanha, retribuindo o apoio dos ruralistas.
Por sinal, a ministra da Agricultura já afirmou que as
reservas indígenas demarcadas serão respeitadas. Ou seja, deixou pressuposto
que não haverá novas demarcações, para dar espaço ao agronegócio, claro! Meio
ambiente? Ora, o meio ambiente!
Não foi à toa que o Prêmio Nobel de Economia de 2013, Robert
Shiller, disse que Bolsonaro lhe dá medo e que "o Brasil é um grande país e
merece alguém melhor".
Pois é, para bom entendedor, 7 minutos bastam.
Depois, "analfabeto" era o outro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigada pelo comentário. Assim que for lido, será publicado.
Volte mais vezes. Se desejar resposta individual, deixe seu e-mail.
De todo modo, identifique-se, para facilitar o direcionamento da resposta.