domingo, 26 de maio de 2013

Comissão da Verdade inclui Raul Soares em mapa de centros de tortura do Estado de S. Paulo

Navio Raul Soares é citado em mapa dos centros de tortura do Estado de São Paulo
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) divulgou, no dia 21, um balanço parcial de um ano de  trabalho. Os dados apresentados parece que surpreenderam a imprensa brasileira e a população.
Principalmente, o fato de navios (como o Raul Soares) terem sido utilizados em 1964 para aprisionar militares dissidentes e lideranças sindicais. Além disso, a informação de que a tortura foi empregada em sessões de interrogatórios desde o início da ditadura.
O espanto geral só prova que, quanto mais o tempo passa, menos se conhece a História recente do País. Afinal, muito do que foi exposto já consta em documentos apresentados há anos à Comissão Nacional de Anistia e à Comissão Estadual de Ex-Presos Políticos de São Paulo, por exemplo.
Nesse sentido, o trabalho da CNV de resgate da memória está sendo de suma importância, porque talvez, agora, os fatos passem a ter reconhecimento oficial. No mapa dos locais considerados como centros de tortura no Estado de São Paulo, a comissão incluiu o navio Raul Soares, que serviu de presídio político no Porto de Santos de abril a novembro de 1964.
Os que foram atingidos logo após o golpe e os seus familiares não se surpreenderam com a divulgação da CNV. Afinal, sentiram na pele os métodos dos golpistas.
Há tempos escrevo sobre isso e me repito: a ditadura e seus métodos brutais não começaram somente após a decretação do Ato Institucional nº 5, em 1968. A porta de nossas casas foi arrombada no dia 1º. de abril de 1964.
Quando o AI-5 passou a assombrar o País, inclusive os setores que apoiaram o golpe de estado, muitos brasileiros já viviam aterrorizados havia quatro anos.
Por isso, é mesmo imprescindível que a CNV reconheça publicamente essas informações. Assim, quando se falar em ditadura, talvez a História Oficial possa esclarecer que:
1. nem todos os opositores do regime militar pegaram em armas, e poucos foram guerrilheiros;
2. a ditadura começou no dia 1º de abril de 1964 e não, em 1968, com o AI-5;
3. a partir de 1º de abril de 1964, sindicalistas de Santos  sofreram prisões ilegais no Dops e no navio Raul Soares, enfrentaram desemprego, perda dos direitos políticos por dez anos, perseguição, ameaças, tortura psicológica e processos na Justiça Militar, embora fossem civis;
4. as famílias dos perseguidos acabaram também sendo atingidas.
No depoimento que demos à Comissão Nacional da Verdade em janeiro, eu e minha mãe fizemos questão de frisar esses aspectos.
A História precisa ser contada por inteiro. A luta e o sofrimento das pessoas que estavam na linha de frente na defesa de um estado de direito, as quais chamo de Geração 64, não podem ser desmerecidos.
Comissão Municipal
Na próxima terça-feira (28 de maio), farei o pronunciamento de abertura da audiência pública sobre o navio Raul Soares, na Câmara de Santos, a convite da Comissão Municipal da Verdade Prefeito Esmeraldo Tarquínio. Tentarei abordar essas questões de maneira sintética.
Participarei como autora do livro "Raul Soares, Um Navio Tatuado em Nós" e, principalmente, porque meu pai, Iradil Santos Mello, esteve preso nesse presídio flutuante da ditadura.
Na época, ele era portuário e diretor do Sindicato dos Operários Portuários, atualmente Sintraport.
Depois das prisões, ele respondeu a processos na Justiça Militar, embora fosse um civil. Em 1980, foi anistiado.
Quatro ex-presos do Raul Soares comparecerão à audiência e darão depoimentos.








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