Hoje, completam-se 52 anos da chegada do navio Raul Soares
ao Porto de Santos, para servir de presídio político da ditadura militar.
Quem acompanha o que
costumo escrever sabe que meu pai foi um dos presos dessa embarcação, que
conheci por dentro aos 6 anos de idade.
Hoje, não escrevi sobre esse fato.
Preferi alertar para o recrudescimento das ideias ditatoriais em nosso País.
O
artigo de minha autoria e intitulado "Para que nunca mais aconteça" está no jornal A
Tribuna, de Santos, edição de hoje, na seção Tribuna Livre (página A-2), conforme imagem ao lado e reprodução de texto abaixo:
Para que nunca mais aconteça
Lídia Maria de Melo. Jornalista, professora do curso de Jornalismo e membro do Grupo de Pesquisa Grupo de Direitos Humanos e Vulnerabilidade da UniSantos e autora do livro "Raul Soares, Um Navio Tatuado em Nós".
É difícil imaginar que, na face da Terra, milhares de seres humanos, em idade de entendimento, não saibam o que ocorreu na Europa durante a Segunda Grande Guerra por iniciativa do regime nazista, sob o comando de Hitler. É público e notório o extermínio de judeus, homossexuais, ciganos, eslavos, comunistas, testemunhas de Jeová, pessoas com deficiência física e mental. O conhecimento generalizado dessa barbárie só está consolidado, porque os judeus não permitem que o mundo se esqueça.
Para que nunca mais aconteça
Lídia Maria de Melo. Jornalista, professora do curso de Jornalismo e membro do Grupo de Pesquisa Grupo de Direitos Humanos e Vulnerabilidade da UniSantos e autora do livro "Raul Soares, Um Navio Tatuado em Nós".
É difícil imaginar que, na face da Terra, milhares de seres humanos, em idade de entendimento, não saibam o que ocorreu na Europa durante a Segunda Grande Guerra por iniciativa do regime nazista, sob o comando de Hitler. É público e notório o extermínio de judeus, homossexuais, ciganos, eslavos, comunistas, testemunhas de Jeová, pessoas com deficiência física e mental. O conhecimento generalizado dessa barbárie só está consolidado, porque os judeus não permitem que o mundo se esqueça.
A Alemanha, berço do nazismo, determinou no
pós-guerra o estudo do passado, para que aqueles atos nunca mais voltem a
se repetir.
Na África do Sul, por 46 anos, prevaleceu o regime
segregacionista Apartheid. Quando Nelson Mandela deixou a prisão, após quase
três décadas, tornou-se presidente. Para reconstruir o país, instituiu um
governo de coalizão. Porém, criou uma Comissão de Verdade e Reconciliação, que
poderia perdoar torturadores, desde que eles confessassem seus crimes e
pedissem desculpas públicas às vítimas.
A Argentina, que enfrentou sete anos de ditadura, conviveu com a morte e o desaparecimento de 30 mil pessoas. A população conhece detalhes dessa trágica história de crimes que violam todos os preceitos humanitários.
A Argentina, que enfrentou sete anos de ditadura, conviveu com a morte e o desaparecimento de 30 mil pessoas. A população conhece detalhes dessa trágica história de crimes que violam todos os preceitos humanitários.
O Brasil viveu 21 anos em regime ditatorial. Nesse
período, o Congresso foi fechado, a Constituição de 1946 foi rasgada, 17 atos
institucionais suprimiram direitos civis. As eleições e o habeas corpus
acabaram suspensos. Ter um objeto vermelho poderia ser prova de subversão. Não
era preciso antecedente criminal ou engajamento político para justificar prisão
arbitrária.
Todo preso político era julgado pela Justiça
Militar. Os processos se arrastavam por anos, antes da indefectível absolvição
por falta de provas. Milhares de civis e militares foram presos, sem culpa
formada. Quem ousou enfrentar as Forças Armadas foi classificado como
terrorista. Todos sofreram punições: prisão, interrogatório, demissão,
processo, tortura, exílio, cassação, morte ou até desaparecimento. Nem a Lei de
Anistia, de agosto de 1979, compensou as perdas. Marcas fincadas na alma
jamais se apagam.
Quem, em nome do Estado, prendeu ilegalmente, torturou, matou, escondeu corpos, até hoje não encontrados, também foi anistiado, sem punição.
Quem, em nome do Estado, prendeu ilegalmente, torturou, matou, escondeu corpos, até hoje não encontrados, também foi anistiado, sem punição.
Toda essa História está documentada. O Projeto
Brasil Nunca Mais, por exemplo, é composto por material recolhido nos processos
que tramitaram na Justiça Militar. O relatório da Comissão Nacional da Verdade
está na internet.
Com tanto material à disposição, por que milhares de brasileiros, regidos por um ordenamento jurídico que classifica a tortura como crime de lesa-humanidade, são capazes de apoiar a homenagem do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015) na Câmara dos Deputados? Alcunhado de Doutor Tibiriçá, o coronel foi o primeiro agente da ditadura a ser reconhecido pela Justiça, em 2008, como torturador. Ele não poupava homens, mulheres ou crianças.
Exceto os que convictamente defendem a ideologia da tortura, quem idolatra Brilhante Ustra e Bolsonaro não sabe o que aconteceu. Alimenta-se de boatos.
No Brasil, o assunto não é aprofundado. O País
falhou, não seguindo o exemplo dos judeus, da Alemanha, África do Sul e
Argentina. Há iniciativas isoladas, mas, de modo geral, a ditadura militar é
abordada superficialmente. Se quisermos evitar a repetição dessa
História, precisamos estudar de fato esse assunto. Para que nunca mais
aconteça. Com tanto material à disposição, por que milhares de brasileiros, regidos por um ordenamento jurídico que classifica a tortura como crime de lesa-humanidade, são capazes de apoiar a homenagem do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015) na Câmara dos Deputados? Alcunhado de Doutor Tibiriçá, o coronel foi o primeiro agente da ditadura a ser reconhecido pela Justiça, em 2008, como torturador. Ele não poupava homens, mulheres ou crianças.
Exceto os que convictamente defendem a ideologia da tortura, quem idolatra Brilhante Ustra e Bolsonaro não sabe o que aconteceu. Alimenta-se de boatos.
Parabéns Lidia ! Fuco perplexa como o brasileiro é mal informado ou não quer saber das barbáries da segunda guerra e da ditadura militar, só nos resta lutar sempre contra !
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